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Projeto visa a proteger crianças do consumismo e da obesidade infantil

Terça-feira, 02 de Abril de 2013

Gandini quer proibir venda de fast food com brinquedinho

O presidente da Câmara de Vitória, vereador Fabrício Gandini (PPS), quer proibir os estabelecimentos comerciais de Vitória de vincular a venda de alimentos a brinquedos – estratégia largamente praticada por redes de lanchonete do tipo fast food. O projeto de lei de autoria do vereador chegou a ser discutido na sessão da última quinta-feira (28), mas a sua votação foi adiada a pedido de alguns parlamentares, diante da necessidade de discutir um pouco mais o tema.


“As crianças são naturalmente mais vulneráveis à sedução da publicidade. E não se pode atrelar a venda de um alimento a um brinquedo. Esse projeto vem a proteger as crianças de dois problemas: o consumismo e a obesidade infantil”, defende o autor da matéria, que também é membro do Conselho Municipal de Segurança Alimentar e Nutrição.


Segundo Gandini, as lanchonetes que costumam praticar essa estratégia comercial normalmente não oferecem alimentos de qualidade, o que acaba contribuindo para um mal que vem se ampliando no Brasil e preocupando pais e nutricionistas: a obesidade. “O Brasil está caminhando para o patamar dos Estados Unidos, em índices de obesidade infantil.”


A argumentação do vereador é completamente corroborada pela nutricionista infantil Marcela Villela, pós-graduada em Psicologia e Reeducação do Comportamento Alimentar pelo Instituto de Pesquisas, Ensino e Gestão em Saúde (IPGS). “Essa compra combinada deve mesmo ser proibida. Se não tomarmos medidas preventivas e educativas urgentemente, vamos em breve chegar aos padrões dos EUA em matéria de obesidade infantil”, avalia a especialista, em entrevista ao nosso site.


. Por que a obesidade infantil é um problema tão grave? Essa preocupação com o tema se justifica?


Sim, a preocupação se justifica totalmente. É na infância que nós aprendemos o comportamento alimentar. Se nessa fase a criança é estimulada a comer esse tipo de alimento [servido pelas redes de fast food], a tendência é que ela perpetue esses hábitos na vida adulta. Além disso, também é na infância que há a alimentação das células conhecidas como adipócitos, as células de gordura. Nós nascemos com um determinado número de células desse tipo, e elas se multiplicam durante três fases da nossa vida, na infância e na adolescência. Na vida adulta elas não aumentam de número, mas apenas de tamanho. Assim, uma criança gordinha vai ter muito mais dificuldade em controlar o peso na vida adulta do que uma criança magra.


Além disso, se na infância eu tenho um problema de alimentação ligado a ganho de peso, tenho mais chances de desenvolver doenças crônicas quando adulto: predisposição a hipertensão, diabetes, colesterol elevado, AVCs... Tudo desencadeado pela obesidade infantil. Essa predisposição ainda é agravada se um dos pais da criança tem sobrepeso. Nesse caso, a tendência de que a criança enfrente o mesmo problema na vida adulta pode crescer de 30% a 40%. Se os dois pais possuem sobrepeso, a predisposição genética da criança aumenta em até 80%. E, se esse fator genético ainda se associa a uma alimentação ruim, aí não tem mesmo escapatória: o hábito alimentar muito ruim por parte dos pais também é transferido à criança. Hoje se sabe que a obesidade infantil decorre em 30% de fatores genéticos. Os outros 70% são determinados pelo ambiente em que a criança vive.


. A senhora acredita que a venda combinada de lanches com brinquedos pode estimular negativamente as crianças ao consumismo e favorecer a obesidade infantil?


Certamente. Essa compra conjugada deveria ser proibida, porque acaba influenciando muito. Você até consegue comprar os brinquedinhos separadamente, mas é quase o preço completo do lanche, o que leva os pais a comprar o lanche para agradar aos filhos. Não resta dúvida de que se trata de uma prática comercial negativa.


Um outro ponto a se considerar é que, apesar de aquele ser um alimento ruim, o pai geralmente tem a melhor das intenções ao comprá-lo. Ele passa muito tempo fora do lar e longe dos filhos, então, quando chega em casa, quer agradar aos filhos e acaba fazendo todas as suas vontades.


. Em geral, qual o real teor nutricional dos alimentos servidos às crianças por redes de lanchonete do tipo fast food?


Em termos de composição nutricional, estamos falando de alimentos ricos em gordura, açúcar e sal: os três componentes que dão sabor aos alimentos. Historicamente, o nosso paladar foi adaptado a esses alimentos por uma questão de sobrevivência. Essas características eram sinal de que o alimento era mais nutritivo para aquela época. Então, nós, seres humanos, temos uma propensão genética a gostar desse tipo de alimento. E a indústria alimentícia acaba se apropriando disso de uma forma muito ruim. Deixa os alimentos mais macios e cremosos, que é tudo o as pessoas querem, especialmente as crianças.


São alimentos muito ricos em gorduras saturadas e gordura trans, que entopem as artérias. As gorduras trans agem diretamente no núcleo das células, podendo levar o indivíduo a fabricar células ruins, doentes, que podem inclusive se converter num câncer. Além do quê, muitos desses alimentos contêm corantes, que geram muitas doenças. Está comprovado que o exagero desses aditivos é uma das maiores causas da hiperatividade em crianças. Há ainda o excesso de conservantes, que a longo prazo também podem conduzir a um câncer. Em suma, alimentos com esse teor nutricional geram grave prejuízo ao desenvolvimento geral da criança.


. Diante de todos esses dados, como a senhora avalia a importância do projeto de lei apresentado pelo vereador Fabrício Gandini?


Sem sombra de dúvida, é um projeto positivo. Creio que no início talvez cause um impacto, principalmente entre alguns pais, que talvez vejam um certo exagero na proibição da venda casada. Mas o fato é que, se não tomarmos medidas preventivas e educativas urgentemente, vamos em breve chegar aos padrões dos EUA em matéria de obesidade infantil. No Brasil, já estamos caminhando para isso e, se não fizermos nada, nosso destino vai ser o mesmo. O custo para tratar as doenças provocadas pela obesidade é bem maior do que o custo para prevenir esse mal.


Marcela Villela – nutricionista, pós-graduada em Psicologia e Reeducação do Comportamento Alimentar pelo IPGS


Autor: Vitor Vogas

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